“Eu acho que é necessário mostrar um pouco mais da nossa realidade, a realidade da mulher trans. Mostrarmos que estamos aqui, que somos reais; que não somos uma lenda urbana nem nada do tipo, e aproveitar dessa visibilidade para divulgar a nossa existência. Divulgar que somos estudantes, somos empresárias, professoras, funcionárias públicas. Quem sabe, divulgando as oportunidades que temos, como, agora, por exemplo, eu posso dar uma visibilidade à minha causa, às pessoas como eu.”
Estas são as palavras ditas por Patrícia Santos, natural de Toritama, no semiárido pernambucano, mas poderiam ser as palavras de qualquer mulher trans do Brasil.
Patrícia, estudante de psicologia, é uma das cerca de 400 pessoas trans que mudaram de nome em Pernambuco por meio da Defensoria Pública do Estado em 2021.
Ela faz parte de uma comunidade que enfrenta dificuldades que vão desde a inserção no mercado de trabalho até o enfretamento do ódio gratuito pelos intolerantes.
São tempos de recrudescimento da intolerância no país. Apenas em 2021, cerca de 140 pessoas trans foram assassinadas no Brasil, de acordo dados divulgados em janeiro pela Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (Antra), no dossiê Assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2021.
São dados como estes que tornam as atividades da Defensoria Pública de Pernambuco ainda mais importantes.
Ela foi atendida pelo Defensor Público Dijalma Carvalho, na Comarca de Toritama, que comentou sobre o procedimento e sobre a alegria de fazer parte deste processo de legitimação jurídica e pessoal. “O caso dela foi interessante, visto que, primeiramente, foi a mãe dela que me procurou. De todas as vezes que estive com elas, pude perceber que a mãe sempre apoiou a sua filha nesse processo de autoafirmação de gênero. A partir do contato direto com Patrícia, pude prestar um auxílio na obtenção dos documentos, que são exigidos pelo provimento do CNJ, e, de posse deles, foi expedido um ofício à Serventia de Registro Civil competente, sendo concretizada a retificação de forma célere”, explicou Dijalma Carvalho.
Para Patrícia, o cuidado, o respeito e a celeridade da Defensoria Pública de Pernambuco, durante todo o procedimento, a deixou determinante. “O papel da Defensoria, para mim, foi fundamental para ajudar a resolver toda a papelada, que, assim, eu era muito leiga em relação a todos os papéis que eu teria que mudar. Foi até a minha mãe que foi atrás disso para mim. Então, ele pediu todos os papéis que precisávamos para fazer a retificação do meu nome e meu gênero. Então, a Defensoria e o Defensor foram muito úteis para mim, muito solidários; respeitavam-me o tempo inteiro. Eu só tenho a agradecer”, esclareceu.
Projeto Me chame pelo Meu Nome
Desde o dia primeiro de março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275, garantiu o direito às pessoas trans e travestis à alteração do prenome e gênero no registro civil, independente de comprovação sobre modificações corporais, laudos psiquiátricos e sem necessidade de processo judicial.
A decisão do Supremo Tribunal Federal, em consonância com a Opinião Consultiva nº 24/2017 da Corte Interamericana de Direitos Humanos, fortaleceu o direito de as pessoas trans e travestis expressarem suas identidades nos respectivos documentos, sem a submissão a procedimentos patologizantes ou o aval de terceiros.
No ano de 2021, o Núcleo de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de Pernambuco (NUDPDH) deu continuidade ao projeto Me Chame Pelo Meu Nome, que objetiva garantir gratuitamente o acesso ao reconhecimento legal não só do prenome, mas do gênero de pessoas travestis e transexuais no registro civil.
Desde julho de 2020, quando foi iniciado o projeto, 14 municípios foram beneficiados por meio dos mutirões realizados e 440 atendimentos foram efetuados até o momento até o final do ano passado, sendo 320 deles apenas em 2021.
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